por Robson Leite
Recentemente, ao ler as mensagens eletrônicas da minha caixa postal, me deparo com um e-mail com uma pergunta bastante interessante em seu cabeçalho: “você acha justo que a escola pública seja pior que a particular mesmo com a enorme quantidade de tributos que nós pagamos?”. Curioso com esta indagação, eu decidi ler mais sobre o assunto visitando o link existente na mensagem em questão, pois se tratava de uma ONG bastante conhecida e que alguns amigos já haviam me relatado sobre a grande quantidade de pessoas que estavam aderindo a esta organização, muito em função das propostas lá existente. Após ler todo o conteúdo sugerido, eu senti uma imensa sensação de frustração e tristeza, pois a tal organização, para minha surpresa, sugeria a redução drástica da carga tributária como solução da pergunta que encabeçava o e-mail justificando a ineficiência do estado em gerir os recursos públicos na melhora de questões básicas como a “educação” e a “saúde”.
Naquele exato instante eu me recordei de um episódio que aconteceu no início da década de 80 em uma importante universidade pública brasileira: “existia no campus desta universidade uma árvore muito rara, quase em extinção, que era fruto de estudos por diversas instituições de biologia e botânica do Brasil. A sua raridade e, principalmente a sua antiguidade, chegaram a trazer diversos pesquisadores internacionais ao nosso país para estudar os aspectos de sua conservação, idade e outras características científicas. Afinal de contas, aquela árvore era, sem sombra de dúvidas, uma ótima oportunidade de estudos e pesquisas aqui no Brasil. Entretanto, ela tinha uma peculiaridade que causava diversos transtornos ao reitor daquela universidade. A antiga e preciosa árvore ficava localizada bem ao lado de um dos muros e, desta forma, era utilizada como escada por alguns ladrões que ingressavam nos finais de semana ao campus para roubarem diversos equipamentos e materiais de laboratório da universidade. Sem tempo para avaliar com calma o problema e tentar resolvê-lo da melhor forma possível, o reitor toma uma atitude drástica: manda cortar a árvore”.
Situação bastante semelhante é a que vivemos no nosso país atualmente, conforme a proposta constante do e-mail que me refiro na abertura deste artigo. A grande concentração de renda que ainda existe no Brasil, mesmo com a razoável melhora dos últimos anos, ainda é o grande problema brasileiro. Isso é evidente e todos sabem disso. Aliás, é bastante comum cobrarmos dos nossos governantes políticas públicas claras para promover uma maior distribuição de renda. Entretanto, qual renda que pretendemos distribuir? Será que uma parcela da nossa elite detentora de boa parte da renda e da riqueza nacional está realmente disposta a abrir mão de alguns “privilégios” para que os mais pobres possam viver com um pouco mais de dignidade? Vide, por exemplo, a falta de regulamentação do artigo da constituição relativo ao imposto sobre grandes fortunas. Imposto que visa, em sua idéia original, cobrar uma alíquota mais alta para o capital especulativo e uma alíquota menor para o capital produtivo e de longo prazo que gera emprego e renda. Por falta de uma lei complementar, desde 1988 este imposto ainda não entrou em vigor. Será que ele existirá algum dia?
É inaceitável, sob o ponto de vista ético e cristão, o contraste entre a situação de miséria e degradação do povo sofrido, refugiado nos cortiços, favelas e periferias das cidades e o luxo e a sofisticação de condomínios fechados, construções suntuosas e desperdício de riquezas, sem consideração pela miséria envolvente. O mais triste disso tudo é que essa desigualdade acontece pela falta de testemunho e vivência evangélica, criando friezas, “cegueiras” e alienação diante do sofrimento humano. Enquanto a violência aumenta nas grandes cidades, aumenta também a indiferença e o descaso pelos graves problemas sociais do nosso país. Nestes momentos, é urgente relembrar, conforme vemos em diversas passagens do Evangelho como Mateus 25, 31-46, a opção preferencial do Cristo pelo resgate efetivo do excluído, definido por Ele como o menor dos irmãos. “Estive nu e me vestistes, estive preso e fostes me visitar. Cada vez que fizesses isso ao menor dos meus irmãos, foste a mim que o fizeste”. Não reconhecer o rosto do Cristo no rosto do excluído é aceitar e se omitir diante do grande pecado social que corrói a nossa sociedade “moderna”.
É urgente, ético e cristão priorizarmos e valorizarmos as políticas públicas e as ações cidadãs que buscam a erradicação da miséria e o fim da exclusão social. A educação pública de qualidade é, por exemplo, um dos mais efetivos e importantes meios de transformação da realidade socialmente perversa em que vivemos. Abrir mão disso, em função da preocupação egoísta e individualista do consumo desenfreado da classe média promovido pelos meios de comunicação social, é afastar o homem de sua dignidade humana e, conseqüentemente, de Deus.
Se queremos realmente ter um país mais digno, humano e menos desigual precisamos, urgentemente, agir em prol da promoção do bem comum. E para isso é fundamental que todas as nossas atitudes, como por exemplo, não trocar o nosso voto por favores pessoais durante as eleições ou agir com ética não sonegando impostos, sejam pautadas e direcionadas no amor ao próximo.
Somente assim é que estaremos caminhando definitivamente para trazer o “Reino dos Céus até nós”. Ou mudamos a nossa atitude nesta direção ou, infelizmente, assistiremos passivos e inertes o sepultamente da nossa sociedade que não tem a coragem de abrir mão do individualismo em prol da coletividade, da partilha e do Bem Comum.
Um grande abraço, a Paz de Cristo e vamos colocar sempre o “Bem Comum acima de tudo”.